Glossrio de cor CECOR
Atravessando a harmonia da cor


Atravessar na música é quase um pecado mortal para um maestro. Numa orquestra sinfônica é uma falta grave, como também o é numa pequena banda. Na bateria de escola de samba, o atravessador, se persistir, cai fora. Mas estamos falando da cor, especialmente da harmonia cromática, onde "atravessar" funciona diferentemente da harmonia musical. Para entender a idéia do "atravessamento", imaginemos um edifício da cor, com muita ordem e hierarquia onde, entretanto, é permitido atravessar na harmonia. Nesse palácio da cor, a base é o espectro cromático de cor-luz, sobre a qual foi erguida sua estrutura de cor-pigmento.

No primeiro andar ficam as cores primárias (P): RM (rosa-magenta), AC (azul-ciano) e AM (amarelo); no segundo andar ficam as cores secundárias (S): AN (anil), VE (verde) e VR (vermelho); e no terceiro, as cores terciárias (T): VI (violeta), AZ (azul), TU (turquesa), VL (verde-lima), LA (laranja) e PU (púrpura).
Como podemos observar, nosso exemplo é uma edificação construída à base de cúpulas pontiagudas, cujo arquiteto talvez tenha se inspirado no Taj-Mahal.
A lei da nossa casa pode ser denominada como "Lei das Misturas", para as quais existem princípios científicos próprios. A nossa lei é apresentada aqui de maneira simplificada, como sendo: a) "se misturarmos duas cores primárias (P) entre si, em partes iguais, obteremos uma nova cor, tão pura como as que lhe deram origem, mas que será uma cor secundária (S)"; b) "as misturas de duas secundárias nunca resultam uma primária".
A lei confirma que, quando da mistura de dois matizes em partes iguais, o resultado será um novo matiz. Misturando-se amarelo com azul dá verde e com vermelho dá laranja etc.
Em nosso palácio, dá para perceber também que as linhas da base e das abóbadas são, na verdade, ligações entre as cores, mostrando como se forma, em cada andar, as cores P, S, T.
A cor RM-P (rosa-magenta - primária) não existe no espectro. Ela pode ser criada a partir da mistura de luzes coloridas das extremidades do vermelho e do violeta, sendo designada no diagrama de cromaticidade CIE como "linha magenta". Mas essa cor existe na forma de tinta (cor-pigmento), na síntese subtrativa.

Ao olharmos para a figura outra vez, podemos perguntar: o que significam aquelas linhas vermelhas, pontilhadas? As linhas pontilhadas são os atravessamentos, ou seja, as ligações harmônicas atravessadas, fora da ordem natural com que as cores se apresentam no palácio e também quando dispostas num círculo cromático, que podemos chamar de "seqüência harmonia".
Não são meras ligações, como se pode imaginar, vendo-se apenas a figura, mas ligações importantes que se dividem em diretas e em indiretas. As diretas ligam cores complementares e as indiretas ligam cores não complementares. Ambas produzem as chamadas "cores neutras" (N), fundamentais para um certo tipo de harmonia cromática.
As cores neutras (N) se relacionam a um conceito fundamental estabelecido originalmente por Goethe em sua "Farbenlehre". O conceito de "polaridade" gera os princípios desse tipo de harmonia que, em homenagem a Goethe, tomamos a liberdade de designá-la por Harmonia Goetheana.
Entre as cores complementares de ligações diretas, os atributos inexistentes numa das cores se encontram na outra. Isso quer dizer que, se atribuirmos uma certa quantidade de pontos para cada par de cores a um determinado atributo, esses atributos estarão parcialmente pontuados numa e na outra cor, normalmente em proporções diferentes.
Vamos supor que, no par amarelo/anil, a sensação de temperatura do amarelo seja avaliada como uma cor de 8 pontos para quente, e que para a cor anil seja atribuído apenas 2 pontos, isto é, que o total das cores, quando juntas, seja de 10 pontos. Isto significa um equilíbrio entre a sensação de pouco calor para uma cor de pouca luminosidade e de bastante calor para o amarelo, uma cor de alta luminosidade. Juntas, elas estabelecem um equilíbrio natural como se cada uma tivessem 5 pontos. Isso ocorre também com os outros atributos, estabelecendo inclusive, que os elementos de polaridade é que definem o contraste visual que duas cores possam ter, pelo fato de serem de cores de polaridade direta, ou seja, cores complementares.
 
Por Nelson Bavaresco - designer gráfico e pesquisador. Ministra cursos e treinamentos sobre Teoria e História das Cores – Linguagem e Significado da Cores - Harmonia e Mistura de Cores. É autor do Sistema de Cores Cecor.
 
Texto publicado originalmente em:
http://www.mundocor.com.br/cores/palaciocor.htm


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